Os viajantes europeus que chegaram ao Brasil na
primeira metade do século XIX buscaram
conhecer uma parte da América até
então desconhecida do seu olhar. Esse desconhecimento
devia-se sobretudo aos impedimentos criados pela
Coroa portuguesa diante de seus domínios
coloniais no Brasil. Só era permitida a
exploração do território
a viajantes, cientistas e administradores ligados
a Portugal. No entanto, com a vinda da família
real para o Brasil, em 1808, esse quadro alterou-se
consideravelmente. Uma das primeiras providências
tomadas pelo rei de Portugal, D. João VI,
ao chegar em terras brasileiras, foi a abertura
dos portos a todas as nações amigas
de Portugal. Esse ato possibilitou o afluxo de
vários viajantes europeus, que buscavam
explorar as potencialidades desta parte da América,
movidos por objetivos de natureza científica
e econômica.
Foi
grande o número de viajantes europeus que
se dirigiram ao Brasil, nas primeiras décadas
do século XIX, para esquadrinhar a imensidão
de seu território, conhecer cada particularidade
da fauna, flora, recursos hídricos e minerais,
bem como os costumes de seus habitantes. Dentro
desse espírito, dirigiram-se para o Brasil
o príncipe Maximilian Alexander Philip
de Wied-Neuwied (1815-1817), Karl Frederic Martius
(1817-1820) e Johann Moritz Rugendas (1822-1825),
todos envolvidos em empreendimentos de natureza
científica e movidos pelo mesmo propósito
de descobrir as riquezas e belezas desta parte
do Novo Mundo. No entanto, eles não foram
os primeiros a percorrer o território brasileiro
no início do século XIX. O inglês
John Mawe esteve anteriormente no interior fluminense
e em Minas Gerais, de 1807 a 1811, tendo publicado
seu relato de viagem em 1812.
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A eleição desses três viajantes
deve-se, basicamente, às seguintes razões:
as suas viagens, além de cobrirem diferentes
partes do território brasileiro, seguiram
um encadeamento temporal, tanto referente ao período
da viagem propriamente dito quanto com relação
ao aparecimento de suas memórias, expressando,
portanto, um tipo de produção própria
da primeira metade do século XIX. Todos os
três são de origem germânica,
cujo sentido aqui deve ser apreendido pelo pertencimento
a um determinado ethos cultural e social.
Isso permitira compreender os vínculos existentes
entre eles e a constelação de artistas,
naturalistas e cientistas que possibilitaram a constituição
de um determinado tipo de afinidade entre o pensamento
científico e romântico da época,
na sua vertente alemã. Finalmente, através
da análise do relato desses viajantes e de
sua produção iconográfica,
pretende-se demarcar as diferenças existentes
entre eles, a partir da visão que tiveram
da própria experiência de viagem, a
identidade e estilo adotado de cada um, ao buscarem
representar a natureza e os habitantes do Brasil.
Ao
abarcarem o espaço do Novo Mundo, os viajantes
posicionavam-se como atores no palco do mundo tropical,
cenário de suas descobertas e explorações,
repetindo alguns gestos dos primeiros momentos da
descoberta do continente americano, o olhar europeu
deparou-se com um novo espetáculo. A partir
da concepção do mundo como teatro,
reencenavam-se alguns momentos da conquista, da
descoberta, do deslumbramento, do estranhamento,
frente a um mundo desconhecido. Dupla face da representação,
a marcar distâncias e aproximações.
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